NOITE DE NATAL
Por Antero Sampaio
“A noite de Natal é no Minho, como em qualquer outra província portuguesa, uma noite de confraternização e de saudade. Ao lar paterno acorrem todos aqueles que, embora dele afastados pelos movimentos da vida, a ele estão presos, moral e emocionalmente , pelo sangue e pelas recordações. Em volta da fogueira vermelha e crepitante, simbolo do calor familiar, todos se deixam envolver pelas labaredas da mesma amizade enternecida e criadora.
Recordo, todos os anos, pelo Dezembro gélido, o que essa noite foi, para minha adolescência. Eu e o meu irmão mal acabávamos de chegar de férias e nenhumas outras nos eram tão saborosas e ledas como essas, logo nos púnhamos a pensar no que seria o pinheirinho azul e infante, cujos galhos nossas tias iriam guarnecer amorosamente de brinquedos e de pratas. A 23, isto é, na véspera da noite consagrada pela tradição, já eu, antevendo a festa próxima, andava saltitante e alegre, irmão dos raios brincalhões do sol, correndo pelos atalhos e pelas várzeas em perseguição dos lençóis de gelo das águas friorentas. Aos pinheirais festivos íamos colher os pinhões com que jogar ao rapa no dia seguinte, ou com que fazer rosários para logo serem comidos. Até que, no próprio dia, quando o bimbalhar dos sinos minhotos nos anunciava a proximidade da ceia e a consequente missa do galo, me deixava tomar do grande eflúvio religioso e pagão – que tanto me obrigava a súplica infantil pela continuação dos meus entes queridos, como me levava a confundir, no mesmo anelo, existências, brinquedos e guloseimas. Já afirmei algures a minha sensibilidade – por vezes a maior inimiga da minha existência – se formou ao sol e à chuva desse Alto Minho formosíssimo, meu altar e meu anseio, onde n asci e onde desejo morrer também. Isso é efectivamente verdadeiro, pois no meu sangue borbulham os mesmos ímpetos de seiva que em todas as Primaveras fazem colorir de verde , amarelo, vermelho e lilás as largas extensões das nossas veigas, sempre que o germinal as torna noivas. Igualmente aquela poesia que tanto grita no escarlate dos poentes como se comove no azul-safira das águas ribeirinhas, se instalou em mim absorventemente, dominando, por vezes, a minha razão crítica. Assim poderá quem quer compreender, sem grande sacrifício do entendimento, todas as consequências emotivas que em mim se confirmam todos os anos e determinados pelo Natal .
Quem conhecer o Minho, saberá que da Noite de Natal até ao Ano Bom se pelos casais e pelas aldeias as Boas Festas. De 1 a 6 de Janeiro cantam-se as “Janeiras”. Também em grupos e mais por folia do que pedinchisse.